Sábado, para a maioria das pessoas, é aquele dia de acordar mais tarde, pra tentar compensar as poucas horas de sono durante uma árdua semana de trabalho, levantando cedo para não perder o ônibus das 7h, não é? Bem, para mim, no último sábado, não foi.
"Antes do nascer do sol, ele é seu filho". Adoro essa frase.
Quem é leitor mais assíduo aqui deve lembrar que o guri está com uma traqueostomia. É até tranquilo cuidar dele, só temos que tomar algumas precauções, como fazer inalação todos os dias, aspirar e limpar a cânula quando há muita secreção, mas principalmente, não deixar a traqueostomia sair da traqueia.
Para quem não conhece, essa é uma cânula de traqueostomia. Repare no cordão que amarra as duas pontas. Isso vai ser importante pro resto da história.
Os primeiros raios de sol mal tinham acertado o horizonte, e eu e minha esposa acordamos com ele tossindo. É algo normal, todo mundo tosse, então continuamos deitados, tentando voltar à terra dos sonhos. Mas de repente ele deu uma tossida mais forte, esquisita, e - depois de meses - voltamos a ouvir a sua voz, num choro assustado. Juro que nunca levantei tão rápido da cama, mas minha esposa foi ainda mais rápida. Ao chegarmos no berço, ele tinha, de alguma forma, desamarrado o cordão da traqueostomia e ela tinha caído. Por causa da rapidez, conseguimos colocar o tubo de volta para dentro (se você é sensível a esse tipo de coisa, tente não imaginar a cena), antes que o buraco começasse a se fechar (porque SIM, os músculos se retraem), e amarramos o cordão novamente.
Nós levantando da cama
Aí você pensa “tadinho dele! Deve ter ficado apavorado!”. Qual não foi a nossa surpresa, às 6h40 da manhã, após todo aquele perrengue, olhar para ele sorrindo e batendo palmas, como quem diz “muito bem, pessoal! Agiram rapidinho!”? Pior: continuou acordadasso, com ótimo humor, querendo brincar com nós 2, todo feliz porque a família tava toda ali reunida.
"Parabéns aí, galera! Muito bom!"
É impressionante, e de certa forma, exemplar a forma como as crianças lidam com as adversidades. Pode ser a inocência a respeito da gravidade da situação, ou a falta de entendimento do que está acontecendo, mas é fato que é difícil ver uma criança que esteja doente, usando algum tipo de aparelho médico ou que possua alguma condição especial e que fique o tempo todo de mau humor ou se lamentando por estar daquele jeito. Tenho um exemplo vivo em casa - que é mais animado e espoleta que muita criança “100% saudável” que conheço - e já vi e convivi com casos como um garoto de cadeira de rodas e uma menina que sofreu paralisia infantil, e nunca os vi deprimidos. Talvez devêssemos nos inspirar nesses pequenos quando acharmos que “tá difícil pra nós”. Pode ser um simples caso de “a ignorância é uma bênção”, ou talvez tenhamos que aprender que há muito mais coisas para se alegrar do que aquele probleminha ou outro que teima em tentar nos derrubar. Mesmo que nos derrube da cama às 6h40 da manhã, mas nos dê um “parabéns” assim que resolvido.