sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Livin' on a Player

Nesses dias estava ouvindo rádio no carro quando começou a tocar “American Jesus”, do Bad Religion. Eu vibrei, comecei a cantar e batucar no volante. Depois dei-me conta que tenho a mesma música no MP3 do mesmo aparelho de som, instalado no mesmo carro, e consecutivamente eu passo dessa música para uma outra quando ouço o início. Penso “ah, essa já ouvi nesses dias”. E mesmo tendo ouvido “nesses dias”, adorei quando tocou na rádio.


Foi mais ou menos assim

Se não fosse pelo ocorrido do mês passado, o meu filho estaria nascendo apenas por esses dias. Todo o nosso planejamento estava focado nesse período, mas quis o destino - esse sarrista - que ele nascesse de uma forma incrivelmente conturbada e que nos fez correr de um lado a outro durante semanas até que o guri, enfim, estivesse bem e em casa.

A semelhança das duas histórias baseia-se no fator surpresa e como ele te afeta no momento. Eu posso passar uma música boa por ter o controle sobre isso, mas é empolgante quando ela se apresenta sem eu ter escolha. Eu posso fazer tudo de acordo com o “script” de “o que fazer quando for ter um bebê” - arrumar a mala do rebento, saber para qual hospital ir, ter o telefone do obstetra em mãos, passar o horário de visitas para parentes e amigos - com toda a calma do mundo, por estar preparado para aquele momento (ter o controle), mas ficar totalmente perdido quando o momento selvagemente aparece do nada e com ares de crueldade.


Like Jon in the snow

O ser humano é prepotente por natureza. Independente do credo ou fé que tenha, no fundo todos achamos que temos o controle de todas as situações. Na verdade, tendemos a tentar manipular a ocasião de forma que seja possível estar no comando. Mas não é bem assim que a vida funciona. Em alguns momentos, o que nos resta é esperar - seja esperar por uma música ruim acabar e torcer para começar uma melhor, ou curtir o momento de uma música boa, esperando que a próxima seja tão boa quanto. Um grande amigo meu fez uma excelente analogia: assim como um soldado despreparado em guarda noite adentro olha para a escuridão como se estivesse enxergando tudo, tendo que permanecer de pé e aguardando o nascer do Sol, para que a tensão e a obrigação de guardar seu posto acabasse, lá estava eu, no hospital, aguardando informações sobre minha mulher e filho sem poder perder a postura. Afinal, como eu já disse na postagem sobre a cadela louca, a maior virtude do ser humano é saber se adaptar a uma adversidade.


Mesmo sem ter o controle do rádio, eu fiquei ali, firme, esperando aquela música horrível - que parecia cantada pelo dueto Gusttavo Lima e Tati Quebra Barraco, com Chimbinha nas guitarras - acabar de uma vez e torcendo para que a próxima não fosse tão ruim, ou pior. E a espera valeu a pena, pois depois tocou uma música incrível, daquelas com 10 minutos de solos animais de Clapton e Knopfler, que tocam no final do show, com chuva de papel picado e o Tyler dando mosh na plateia, enquanto o Burton distribui palhetas. E quando essa música tocou, eu vibrei, comecei a cantar e a batucar. E se estivesse na minha lista de MP3, deixaria no repeat por um bom tempo.


terça-feira, 26 de agosto de 2014

Metamorfose ambulante

Muita gente não sabe, mas esse não é meu primeiro blog. Eu tive um há alguns anos atrás, quando começou a modinha. Mas eu, sempre contrário a tendências, quis fazer um blog diferente do que era feito na época.

Para quem não lembra, o conceito de “blog” era inicialmente ser um diário virtual e público. As pessoas contavam sobre seu dia, a meninada falava do boy magia que eram afim e os moleques basicamente falavam de videogame. Já eu pensei em fazer uma linha diferente: não falar nada da minha vida - mesmo porque eu sempre fui muito reservado - mas sim falar do cotidiano, de fatos curiosos, fazer piada ou críticas a um determinado assunto.

Agora cá estamos, mais ou menos 10 anos depois, e eu estou pisando em cima de todos os meus conceitos antigos. Eu, num tempo em que o conceito “blog” mudou para exatamente o que eu fazia no início (sim, eu criei uma tendência, deal with it =D), voltei a falar sobre a minha vida. Na verdade, no caso, a minha e do meu filho.

Engraçado como as pessoas mudam com o tempo, seja nos propósitos, nos planos, nos conceitos e até mesmo no caráter. Eu era um moleque revoltado com “o sistema”, queria morar sozinho (mesmo sendo apenas um office boy), ter uns 5 filhos e ganhar meu primeiro milhão antes dos 30. No fim, aprendi que todos fazemos parte do tal “sistema”, seja pelo seu emprego, pela sua atitude ou pela “necessidade” de comprar um carro zero. Fui direto da casa da mãe para morar com minha esposa em um apartamento alugado, tive meu primeiro - e talvez único - filho aos 29 e o mais perto de um milhão que cheguei foi em alguma festa junina, na barraca de milho verde.
um milhão

Na mesma levada, conheço várias pessoas que mudaram muito com o tempo: tem amigo meu que era roqueiro convicto e hoje vai em show de sertanejo, amigo que dizia que nunca iria namorar, ia só curtir a vida e agora está praticamente casado, amigo que prometeu que nunca iria beber porque cerveja tinha gosto ruim e hoje é um louvável pé de cana.

A verdade é que nossos planos e nossas convicções mudam de acordo com a necessidade. Nesse blog tenho escrito sobre tantas coisas que gostaria de fazer para o meu filho no futuro, mas eu não posso nem prometer isso sem ter uma pulga atrás da orelha. Será que meu pensamento será o mesmo que tenho hoje? Será que eu não trocarei as minhas prioridades?

Quando eu tinha meus 15 anos, lembrava de como eu era com 13 e pensava “nossa, como eu era um idiota!”. Com 19, lembrava dos meus 15 e pensava “nossa, como eu era um idiota!”. Com 25, a mesma coisa a respeito de quando eu tinha 19 anos. Hoje, lembrando de mim nas 25 primaveras, adivinha? De duas uma: ou quanto mais envelheço, minhas certezas de antigamente transformam-se em interrogações de acordo com a experiência que angariei nos anos subsequentes, ou ser um idiota é uma condição vitalícia. Só espero que a minha idiotice não me desvirtue da prioridade de criar meu filho da forma mais correta possível, mesmo sem carrinhos, rock n’ roll, perseguições ninjas e sem saber quando colocar luvas de gaze ou segurar seus braços junto ao corpo.





sábado, 23 de agosto de 2014

Guia passo a passo: como fazer uma mamadeira

Nesses dias meu primo perguntou “por que você não faz um guia passo a passo de como fazer uma mamadeira para o bebê?”. Eu sei o que você está pensando, mas embora pareça trivial, há certos detalhes que um pai precisa saber a respeito dessa arte milenar. Uma das propostas desse blog é exatamente auxiliar outros pais ou futuros pais a exercer da melhor forma possível essa tarefa vitalícia que é a paternidade. Por isso, aqui vai o Guia passo a passo de como fazer uma mamadeira corretamente:


1- Lave bem as mãos, seguindo as instruções a seguir:



2- Coloque água para ferver. IMPORTANTE: precisa ser água da torneira, visto que a água mineral pode conter resíduos prejudiciais ao bebê.


3- Após fervida a água, coloque com calma na mamadeira a quantidade indicada pelo pediatra e cuidado ao manusear para não se queimar!


4- Coloque uma medida de leite - que vem junto com a lata - para cada 30 ml de água. Não exagere na medida!


5- Fixe a tampa interna da mamadeira (aquela parte que parece um disco) e chacoalhe bem para misturar o leite, de acordo com os movimentos abaixo:

dig din dig din


6- Retire a tampa interna e coloque em água fria corrente para baixar a temperatura.



7- Pingue uma gota do leite na mão para verificar se não está muito quente.

No caso da animação acima, a temperatura está “ok”

8- Sirva o bebê com calma para que ele não se afogue.


Pronto! Espero que esse guia tenha sido esclarecedor o suficiente, e que ajude outras pessoas a dominar os mistérios envoltos nesse procedimento crucial para a sobrevivência do rebento. Meus cumprimentos.

quarta-feira, 20 de agosto de 2014

The Future is Now

Por que a primeira coisa que me falam quando digo que meu filho foi para casa é “tá conseguindo dormir?” ou “é, agora que começa a batalha de verdade!”, hein?

Primeiramente: o bebê mais dorme do que fica acordado. Normalmente nós que temos que acordá-lo para que mame nos horários corretos. Ele quase não chora, mal resmunga, e é muito bonzinho. O meu cachorro latindo no quintal me priva mais do sono do que meu próprio filho.

Por favor, pare com isso.

Ok, foi só um desabafo. Se você perguntou algo do tipo ou falou algo do tipo, não se sinta mal, nem pense que estou bravo com você. Mas parece que criou-se uma mística negativa a respeito de o que é ter e criar um filho, porque a grande maioria dos que fizeram esse tipo de comentário são pessoas que não tem filhos.

Chega a ser assustador como boa parte do povo gosta de desencorajar decisões como casamento, gerar e criar filhos, formar uma família. Quando comuniquei que estávamos esperando um filho, muitos me perguntaram se tinha sido planejado, como se com 29 anos e 2 anos e meio de casados ainda fossemos muito novos ou imaturos para criar uma criança. Aí perguntavam de dinheiro, se já tínhamos feito tudo que queríamos fazer como casal, etc., etc. Teve gente que disse que temos muita coragem em colocar um filho em um mundo tão desorientado como o de hoje. Tiveram outros, com mais ou menos a mesma idade que a nossa, que disseram que nem pensam em ter filhos, porque precisam focar na carreira. Teve ainda quem falasse que não quer ter filhos, que é egoísta demais para pensar em dividir a vida com alguém que dependa 100% dela. Tiveram os que falaram que preferiam viajar e pensar lá perto dos 40 em ter um filho, ou adotar um - porque né, muito empenho ficar lá carregando por 9 meses, não poder beber, ter dores no parto e tudo mais.

Eu compreendo que talvez não seja seu plano ter um filho, ou pelo menos não tê-lo tão logo, mas convenhamos que é um caminho meio natural, biológico. “Crescei-vos e multiplicai-vos”, afinal sem filhos a humanidade um dia acaba. O que me espanta não é quem não quer ter a mesma experiência que eu estou tendo, mas sim os que acham isso um absurdo. Cada um sabe o que é melhor para si, e eu respeito isso. Mas seria importante se informar um pouco mais sobre tudo o que engloba gerar um filho. Ter um filho não é só as fraldas sujas, os vômitos de leite, as noites mal dormidas, a carteira vazia, a conta do banco no vermelho. É a sensação de deixar algo para esse mundo. Para mudar o futuro, tem que começar fazendo algo desde já, não?

Dizem que você precisa escrever um livro, plantar uma árvore e ter um filho. Mas não adianta escrever o livro e não publicar, plantar a árvore e não regar e ter o filho e não cuidar dele para que se torne um cidadão de bem. Publicar um livro deve ser um processo chato e burocrático, regar a árvore todos os dias pode ser entediante, mas ajudar o filho a crescer me parece ser uma aventura diária. E é por isso que escolhi colaborar com o futuro mundial dessa forma. Mesmo que me custe algumas horas de sono.


Obs.: a ordem é “escrever um livro, plantar uma árvore e ter um filho”. Não é pra plantar o filho, escrever no filho, plantar um livro ou escrever na árvore, ok?




domingo, 17 de agosto de 2014

Missão: Impossível

Quando eu tinha mais ou menos uns 10 anos, encafifei que queria comprar um presente de Dia das Mães para - obviamente - minha mãe. Mas eu queria ir sozinho, escolher e pagar com o dinheiro que eu tinha.

Naquela época, existia no centro da cidade uma feira de artesanato, montada todos os domingos pela manhã. Eu já era acostumado a ir lá com meus pais, meus tios e meus avós. E já sabia qual ônibus pegar e onde parar. Claro que, na primeira metade dos anos 90, a realidade era outra: a cidade era bem mais tranquila, o índice de assaltos ainda era pequeno, e era normal - pelo menos para mim - crianças pegarem ônibus sozinhos. Mas ainda assim, ir sozinho para o centro não era algo comum e totalmente seguro. Ainda assim, eu estava predestinado a ir. Falei com o meu pai, que depois de muita deliberação, aprovou.

Saí faceiro, todo dono de mim, para pegar o ônibus. Paguei ao cobrador a passagem, sentei no banco e esperei ansioso pelo momento de apertar o botão de parada quando chegasse perto da feira. Minhas pernas pequenas - balançando no ar por não ter altura ainda para alcançar o chão do ônibus - não exprimiam o meu sentimento de grandeza por estar sozinho e a caminho de cumprir um feito tão representativo para alguém da minha idade.

Ao chegar na feira, passeei pelos corredores da feira, vendo em cada barraca um presente que pudesse representar a importância da minha eletrizante jornada. Quando gostava de algo, gravava onde a barraca estava e partia para a próxima. Obviamente eu não tinha muito dinheiro - 10 anos né, minha gente - e por isso precisei caminhar bastante para encontrar algo que me apetecesse. No fim, nem lembro exatamente o que eu comprei. Só lembro da minha sensação de missão cumprida ao voltar para casa.

foi mais ou menos assim que me senti durante o passeio

Ao ler essa história, você pode pensar “meu Deus, com 10 anos e andando sozinho no centro? Que tipo de pai permite isso?” ou “nossa, então o mundo hoje está muito mudado, pois eu nunca deixaria meu filho de 10 anos pegar ônibus sozinho, muito menos ir para o centro!”, entre tantos outros pensamentos recriminatórios. Mas algo que eu não sabia - e fui descobrir apenas há algum tempo atrás - é que meu pai foi atrás de mim. Me seguiu por todo o trajeto, me observou parar em cada barraca, e quando me perdia de vista no meio da multidão, se enfiava no meio para sempre saber onde eu estava. E eu, ingênuo, em nenhum momento desconfiei, sequer olhei para trás. Diz meu pai que, em alguns momentos, quando eu me virava, ele se escondia no meio das pessoas, para que eu não o visse.

Provavelmente, se eu descobrisse na época, eu ficaria bravo com ele, reclamaria que ele não confiava em mim ou que ele não me deixou caminhar com minhas próprias pernas (como se eu já tivesse idade para tal). Mas hoje eu fico admirado em pensar na atitude dele. Ele encontrou um jeito de demonstrar que confiava em mim quando eu mais queria isso, de me proteger durante todo o percurso e ainda de observar o quão capaz eu era de executar a tarefa que eu disse que iria fazer. Para mim, essas duas horas entre sair e voltar de casa é uma síntese dos deveres de um pai durante a vida toda do filho: proteger sem precisar se mostrar, observar sem alarmar e confiar sempre que o filho prove que merece tal confiança.

Não sei se terei que seguir meu filho, feito um agente secreto ou um ninja, também duvido que ele pegue ônibus sozinho aos 10 anos de idade. Não sei dizer em que momentos da vida eu poderei aplicar os mesmos ensinamentos que tive com esse pequeno fato da minha infância, mas se essas atitudes forem necessárias para fazer meu filho se sentir tão bem quanto me senti naquele domingo, com certeza eu o farei.



quarta-feira, 13 de agosto de 2014

Dm

Há uns dias atrás fui comprar o Hot Wheels deste mês para o meu filho. Quando cheguei perto do caixa da loja, uma vendedora olhou para mim e perguntou “você faz coleção?” e eu respondi “não, é para o meu filho”. Ela me olhou por uns 2 segundos, virou as costas e saiu.

Tenho certeza que ela pensou que eu estava tirando sarro da cara dela, afinal eu não tenho cara de pai. Na verdade, eu mal tenho cara de adulto. Isso me fez pensar em quantas situações peculiares eu provavelmente passarei quando estiver com meu filho. Um costume geral da sociedade atual - e talvez desde sempre - é de analisar e prejulgar as outras pessoas apenas pelo olhar. Tenho certeza que pensarão que sou o irmão mais velho, o primo ou até mesmo mais um adolescente que engravidou a namorada de 15 anos e agora tem que arcar com o pesar de ser pai antes da vida adulta. “Mais uma família precoce que vai sofrer, meu Deus!”, será provavelmente o pensamento da Dona Cremilda.
Dona Cremilda não aprova gravidez na adolescência


Eu também não ajudo: ando, de preferência, de moletom de touca, camisa de time ou de banda, calça jeans e All Star. Quando boto um terno, pareço um pajem. Camisa social? Pareço um menor aprendiz. Teve uma vez que fui a um bar noturno, já com minha carteira de motorista à mão - pois sempre pedem - e o host apenas perguntou meu nome e me deu a ficha de consumação. Fiquei todo feliz! “Puxa vida, nem precisou pedir a minha carteira!”, pensei. Aí olhei bem na ficha, onde estava escrito em letras garrafais “MENOR”. Mesmo com uma aliança dourada na mão esquerda, o rapaz não teve dúvida alguma ao preencher os dados naquele maldito pedaço de papel.

Pra não dizerem que é mentira

Mas por que estou falando disso? Bem, hoje o meu filho finalmente recebeu alta e agora está em casa. É a partir de agora que terei que mostrar ao mundo que sou pai. Não que me importe com o que os outros pensam - passei 29 anos da vida tendo que conviver com isso, e passarei muitos mais. Você é julgado a todo momento, por todos, e deve lutar da forma que puder para que nenhum desses julgamentos te danifique de alguma forma. Só que agora não sou mais só eu. Agora tem meu filho também, e eu que terei que ser seu escudo por pelo menos mais 18 anos. Terei que protegê-lo da mesma sociedade que ele ainda fará parte, e tomando porrada no lugar dele, seja sendo considerado seu irmão mais velho, seja sendo considerado um pai “de menor”, seja afirmando que a coleção de Hot Wheels é minha quando ele tiver seus 15 anos e estiver com vergonha de assumir ao mundo que ainda coleciona carrinhos.

domingo, 10 de agosto de 2014

Epifania! Epifania! Epifania!


Ontem me tornei oficialmente “pai”. Não foi porque peguei meu filho no colo, nem porque dei a primeira mamadeira. Também não foi por receber a primeira vomitada de leite ou porque coloquei sua primeira roupa. Na verdade, não teve nada a ver com o meu guri.

Estava eu almoçando em um restaurante, entre as visitas na maternidade, quando um grupo de adolescentes sentou na mesa ao lado. Não costumo ouvir a conversa alheia, mas eles falavam tão alto que eu não conseguia nem ouvir meus próprios pensamentos. O grupo, de grande maioria feminina, devia ter entre 15 e 16 anos, e o assunto principal era “bunda”. Que menino tinha a bunda mais bonita, quem olhava pra bunda de quem, quem da mesa tinha a melhor bunda, etc.

Eu, ouvindo aquilo, e olhando para eles como se fossem crianças no playground, fiquei abismado com o assunto. “Mas são só crianças!”, pensei. Aí que, assim como Homer Simpson, tive uma epifania: quando eu tinha meus 15, 16 anos, eu aprendi a beber, comecei a ver as garotas “com outros olhos”, entre outras coisas que todo adolescente faz e não preciso detalhar aqui ( ͡° ͜ʖ ͡°).

“Valeu, dona peituda!”

Sempre acreditei que os pais eram, de certa forma, "hipócritas" ao criticar, coibir e até impedir que adolescentes fizessem coisas de adolescentes, já que é muito provável que eles fizessem exatamente as mesmas coisas quando tinham seus 15, 16 anos. Contudo, o acontecimento de ontem me provou que, ao atualizar o status para "pai", suas memórias de adolescência são enterradas em um canto obscuro da memória, onde tudo de rebelde e malicioso se transformou em lembranças de escorregadores, pega-pega e bonecos de Comandos em Ação - sim, sua memória te engana e te faz pensar que ainda brincava com carrinhos e bonecos quando estava com 15 anos.

É assustador pensar que, quando meu filho tiver seus 15 anos, algumas meninas já estarão dando um "confere" no formoso traseiro dele, que hoje é apenas um pedaço rosado de pele com cheiro de Hipoglós - e imagino que ser pai de uma menina deve ser mais desesperador ainda. Aí sim eu entendo meus pais, assim como os pais em geral, ao tentar inibir os filhos a agirem como naturalmente os adolescentes agem. É praticamente uma tentativa de frear a Mãe Natureza, pois quem lembra bem de sua adolescência, ou está passando por ela nesse momento, sabe como muitas vezes seu instinto responde muito mais rápido do que a noção de certo e errado. A questão é que, assim como falei no texto sobre as lutas de boxe clandestinas, os pais também instintivamente tentarão proteger o filho de fazer as besteiras que a vida demanda para se tornar um adulto experiente e consciente de seus atos.

No fim, somos realmente todos animais, sempre lutando contra nossos próprios instintos. Ou sendo forçados a lutar contra eles.

entendedores entenderão

quarta-feira, 6 de agosto de 2014

Tacale pau nesse carrinho, Bruci!

Desde que soube que seria um menino, combinei com minha esposa que iria comprar um carrinho Hot Wheels por mês, para que ele tenha uma coleção bacana para brincar quando tiver a idade apropriada. Nunca fui muito fã dos carrinhos da Hot Wheels (principalmente aqueles com design estrambólico), mas sempre gostei de miniaturas de carros. Quanto mais caprichadas, melhor. Mas essas são só para admirar, não tem muita graça de brincar. Já os Hot Wheels tem o tamanho perfeito para ser possível criar uma boa pista de corrida em um espaço não necessariamente grande.

tenho que encontrar um desses pra comprar

Quando eu era criança, tinha uma coleção de carrinhos também. Mas era bem mais modesta - tinha apenas um carrinho de metal, que era o meu favorito. Os outros eram de plástico, de tamanhos variados, desde aqueles que você encontra dentro daquela bexiga gigante em festas de criança até os que vem de brinde junto com a maria mole. Tinham alguns também que vinham no Kinder Ovo. Eu, fã de Fórmula 1 desde que aprendi a entender do que isso se tratava, enumerava cada carrinho meu de acordo com os pilotos da temporada e, obviamente, o carrinho de metal era o Ayrton Senna. Eu me trancava no quarto e fazia uma pista no chão usando lápis, dominós, peças de tabuleiro e o que mais tivesse em mãos. Cheguei até a fazer o túnel de Mônaco com um tabuleiro de Ludo. E lá passava a tarde, fazendo um carrinho ou outro bater, forçando ultrapassagens que provavelmente a física não saberia explicar, e no fim, fazendo o Senna ganhar. E eu me divertia.


Teve gente que me questionou “mas essa coleção é para seu filho mesmo ou é para você?”. Posso parecer meio nostálgico ou romântico demais, mas eu gostaria que meu filho passasse seu tempo como eu passava antes. Não se ligasse tanto em Angry Birds, Candy Crush ou nos desenhos derrete-cérebro que existem hoje (ainda vou falar sobre isso noutro dia). Fosse um pouco menos escravo da tecnologia e do entretenimento digital (como eu mesmo sou hoje) e botasse mais a mão na massa para criar, brincar e se divertir. É por isso que comecei essa coleção: para ele ter vários carrinhos interessantes para brincar, e possa escolher o seu próprio favorito para ser o vencedor. Não sou daqueles pais que querem fazer coleções “intocáveis” para os filhos, com medo que quebrem, estraguem, comam uma rodinha ou amassem a lataria - afinal a coleção é sua ou da criança?


domingo, 3 de agosto de 2014

Sobre jarras de cristal e baratas

Hoje peguei o meu filho pela primeira vez. Quem leu o texto “Hamlet” sabe da minha preocupação para com tal fato. Embora ainda não tenha o peso ideal para sair da incubadora, as enfermeiras já possibilitam tirá-lo de lá para ficar no colo dos pais por um tempo. Minha esposa já tinha pegado, mas eu continuava me esquivando desse momento, visto que eu tinha me programado a pegá-lo só após os primeiros dois… anos.

foi mais ou menos assim que aconteceu

Sentei-me em uma cadeira ao lado do posto em que ele fica e uma das enfermeiras o enrolou em um cobertor. Não precisei nem fazer a posição “Hamlet”, mesmo porque ele é pequeno demais para isso. Ele pesa pouco mais que um quilo e meio, e ainda assim saí com meu braço esquerdo tenso e dolorido como se tivesse passado a tarde fazendo mudança. Não pareceu tão complicado, mas ainda assim aquela cabecinha molenga te dá a nítida impressão que ele pode quebrar só de olhar. E ele só dormiu. Dormiu como se tivesse em um lugar seguro e aconchegante, e não em um pedaço de braço que parecia estar no meio de um terremoto. Abriu os olhos uma ou outra vez e não pareceu se assustar em não estar no seu leito reto, fofo e quentinho, mas sim encostado no peito de um cara visivelmente assustado com a jarra de cristal caríssima que estava segurando.

Então, percebi: assim como uma dona de casa que morre de medo de barata, eu estava morrendo de medo de algo que, teoricamente, é inócuo. Não tinha motivos para ter medo de estar com ele, de segurá-lo, de mexer de um lado a outro. Ele é mais forte e mais resistente do que aparenta, e eu ainda o pegarei por inúmeras vezes durante toda a vida. Eis que consegui desativar a bomba relógio, agora só falta conseguir fazer isso das próximas vezes sem suar frio, sem tremeliques e sem deixar o braço tão tenso quanto o cachorrinho desta foto:


sábado, 2 de agosto de 2014

"Não importa o quanto você bate, mas sim o quanto aguenta apanhar e continuar"

Comentei no texto "Boys don't cry" que no segundo dia o meu filho já estava sem o respirador. Mas o que não comentei é que ele o removeu sozinho. Agarrou o tubo, puxou pra fora, e quando as enfermeiras se deram conta, ele estava erguendo o acesso do respirador como se fosse um troféu. O pediatra notou que ele conseguia respirar sozinho e o manteve assim. Após isso, ele várias vezes também tentou remover a sonda de alimentação e a sonda que repassa os antibióticos. Nesses dias cheguei para a visita e me deparei com o guri com as duas mãos envoltas em luvas feitas de gaze. Meu primeiro pensamento foi que faziam lutas de boxe clandestinas com os recém nascidos durante a madrugada, e o vencedor ganhava mais leite no dia seguinte, mas a enfermeira logo me explicou que era para evitar que ele removesse as sondas.
Levanta a guarda! Levanta a guarda!

Engraçado pensar que, de certo modo, ele já havia recebido o primeiro castigo da vida. Não é permitido remover as sondas, por mais incômodo que seja, caso contrário terá que usar luvas feitas de gaze.

Como as sondas incomodavam - e não era mais possível tentar removê-las - ele logo começou a ficar nervoso, a se contorcer e chorar. Aí aprendi um truque novo: ao segurar os bracinhos junto ao corpo, de forma cuidadosa, porém firme, o bebê se acalma. Boatos que ele se sente aninhado, com lembranças de quando estava na barriga da mãe.

Quem me dera se toda a educação do filho fosse baseada em cobrir suas mãos quando quisesse fazer algo errado e segurá-lo com firmeza quando estivesse nervoso. Mas a medida que ele cresce, sua mente se desenvolve, suas necessidades e curiosidades mudam, e os pais precisam mudar junto. O que hoje é uma sonda que não pode ser retirada, amanhã pode ser a escada que não pode subir, a terra do jardim que não pode comer ou o rabo do cachorro que não pode puxar. E depois será o dinheiro da carteira que não pode pegar ou a chave do carro que não pode sair de cima da estante - muito menos entrar na ignição. E não importa por qual motivo ele fique nervoso - seja pela proibição, por dor ou por acasos da vida - será cada vez mais difícil para os pais descobrirem o que fazer para acalmar seu rebento.

O excesso de zelo também pode acabar por criar um indivíduo frustrado e/ou sem experiências de vida. Por isso, encontrar o equilíbrio entre a proibição, a proteção e a permissividade é crucial para que o filho se desenvolva como um adulto bem resolvido(e ainda tem gente que acha que o pior de ter um filho é ter que pagar a faculdade).

Nenhum pai quer ver seu filho sofrendo, errando ou se dando mal. Contudo, às vezes o filho precisa tirar as sondas da vida para perceber que, por mais que estejam incomodando, é pior ficar sem elas. E em alguns momentos não terá ninguém para segurar seus braços junto ao corpo na hora que a angústia ou a raiva baterem. A vida não é um morango split com tubetes e cobertura de Confeti, ela é aquela bala azeda e amarga, dura pra caramba, que demora um tempo até dissolver toda a parte ruim e conseguir chegar no recheio doce. Eu acredito que pais e mães devem sim proteger e coibir o filho, mas isso não pode virar rotina. Colocar a todo momento luvinhas de gaze ou aconchegar com as mãos o seu filho sempre que algo incomodar é aliená-lo de tal forma que, assim que ele sentir o gosto acre da bala, vai querer cuspi-la e nunca mais colocar na boca.
a vida não é isso