quinta-feira, 13 de abril de 2017

Curtinha #6


No jornal, pela manhã, passou uma reportagem sobre a visita do escritor Nicholas Sparks aqui no Brasil. Em um determinado momento, uma garota, aos prantos, apareceu para abraçá-lo na sessão de autógrafos e nem conseguia dar entrevista depois. Pensei comigo mesmo “caramba, tudo isso só por conhecer o escritor?”. Algumas horas depois fui dar um lanche para o pequenote. Decidi tentar dar uma bolacha (biscoito? Vocês decidem), já esperando sua rejeição. Para minha surpresa ele não só pegou a bolacha como começou a comer sozinho, arrancando pedaços com seus dentinhos e mastigando direitinho. Meus olhos encheram de lágrimas. Pode parecer besteira, mas só quem acompanhou toda a história do guri irá entender o quão significativo foi isso, já que as lesões cerebrais causadas no ano passado o fizeram regredir em muitos pontos, inclusive na deglutição - ele evitava mastigar, cuspia pedaços de comida que julgava “grandes demais” e muito raramente levava algum alimento à boca. Percebendo isso, vi o quão injusto estava sendo com a menina fã do Nicholas Sparks: o choro dela com certeza tinha uma razão de existir, razão que só ela sabe o peso que tem. Cada um tem uma história e não cabe a ninguém julgar. Então, desculpa, garota-que-apareceu-chorando-na-reportagem.

COMPARTILHEM ATÉ CHEGAR À GAROTA. (não custa tentar, né?)

quinta-feira, 6 de abril de 2017

Chegadas e partidas


O interessante de ir trabalhar de ônibus sempre no mesmo horário é que alguns rostos começam a se tornar conhecidos com o tempo. Pessoas que também pegam o mesmo ônibus, dia após dia, se tornam familiares. Pessoas familiares com quem nunca se trocou um oi, um aceno e que nem sabemos o nome. Quando passei a usar o coletivo, percebi que todo dia um casal jovem, de possíveis vinte e poucos anos, embarcava a duas paradas à frente da minha. Ele tinha cara de “Rodrigo” e ela de “Jaqueline”. Se estavam de pé, Rodrigo sempre abraçava Jaqueline, e se despedia com um beijo e um “te amo” quando ela descia, três pontos antes da parada dele. Tempos depois, ela passou a se sentar no banco preferencial enquanto ele ficava de pé, segurando a bolsa dela. A razão era óbvia: Jaque estava grávida. O ritual da despedida continuava. Mais alguns meses de idas e vindas do trabalho e o barrigão já apontava que logo logo a criança de Jaque e Rodrigo nasceria, e era bonito de ver a mão esquerda de ambos, cada qual com uma aliança dourada no dedo, repousando sobre o ventre quando o casal conseguia sentar-se um ao lado do outro no busão lotado. Dias passaram e Rodrigo já estava pegando o ônibus sozinho. Nessa época comecei então a ir para o trabalho de bicicleta e pegar ônibus se tornou mais raro. Uns dois ou três meses atrás estava chovendo de manhã e me obriguei a usar o transporte público mais uma vez. Logo entraram Jaque e Rodrigo e ficaram juntos, de pé, abraçados, como sempre fora. Mas nessas idas e vindas, algo mudou.

Phopho

Semana passada usei o ônibus mais uma vez. Jaque entrou sozinha e eu já estranhei. Parou quase na minha frente, onde uma amiga dela estava sentada. Ela se segurou na barra vertical com a mão esquerda e notei a ausência do anel de ouro. Fiquei angustiado e não queria acreditar. Preferi pensar que ela podia ter esquecido a aliança em cima da pia, quando a tirou para passar creme nas mãos. Logo as duas começaram a conversar. Nunca fui de ouvir a conversa alheia, mas naquele momento eu precisava saber o que estava acontecendo, afinal já nos conhecíamos há tanto tempo, não é? Jaque não podia fazer aquilo comigo! Entendi poucas partes: a criança se chama Rafael, ela gastou 160 reais de medicamentos na farmácia e, mesmo sem conseguir ouvir toda a frase, o ódio no olhar dela revelou o que eu não queria crer que era verdade - Jaque e Rodrigo se separaram. Juro que fui trabalhar deprimido.

Pra você que leu e/ou assistiu "A Garota do Trem": sim, foi uma referência direta

Sempre que fico sabendo de algum casamento que acaba, me bate uma tristeza. Sou um homem "à moda antiga", que pensa que um casal tem que pensar muito antes de resolver casar, precisa ter muita certeza que poderão conviver em harmonia (e juntar dinheiro também, porque fazer festa de casamento é muito caro!). Vejo meus avós, que recentemente comemoraram 60 anos de casados e imagino no que nossa geração está errando, pois parece que de nada adianta 5, 6 anos de namoro para que o casal se conheça bem, já que bastam um ou dois anos de casados para decidirem que “não era pra ser”. Será que estamos nos tornando mais intolerantes nos relacionamentos? Será que a instituição “casamento” está realmente falida? Aprendemos a crescer mais independentes e criamos uma certa “casca” para aceitar algo que encaramos como uma “intromissão alheia”, como os pedidos do cônjuge ou as obrigações que criar uma família nos demanda? Ou desaprendemos a lidar com críticas, com dificuldades e até assumir os próprios erros a ponto de preferir desligar o videogame ao tentar matar o chefe da fase? Qual é o segredo dos mais velhos para os relacionamentos duradouros que mantém viva a tradição do almoço de domingo com a família reunida? Há quem diga que “os tempos eram outros”, que a mulher se via obrigada a continuar casada porque na sociedade dos anos 60, 70, ela era dependente do marido trabalhador, ou também que um casal separado era “mal visto” pela comunidade em geral. Pois eu ponho a minha mão no fogo para dizer que meus avós se amam e já demonstraram isso inúmeras vezes em frente à toda família gerada pelos seus seis filhos. Por isso, tenho certeza: tem algum segredo sim, só esqueceram de nos contar - ou acharam que teríamos a capacidade de descobrir por conta própria.

Continue? (X)Sim (  )Não

Talvez os tempos sejam mesmo outros e tenhamos que aprender a conviver com essas chegadas e partidas do amor, do afeto, da compreensão e da compaixão. Apenas sinto pelo Rafael. Por mais que Rodrigo se esforce para ser um pai presente, por mais que Jaque tenha plenas condições de criar e educar Rafael como mãe solteira, sei que tanto Rafael quanto Jaque quanto Rodrigo sofrerão no dia a dia. O casal por não ter o apoio um do outro nos pequenos momentos da vida e o pequeno Rafael por não ter mãe e pai sob o mesmo teto.