sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Quem não chora, não vira um mala

Se tem uma coisa que posso dizer que aprendi com meu pai é “não seja um mala”. Eu tenho até urticária de ir, por exemplo, a um mercado, e ver criança esperneando, berrando e fazendo pirraça porque quer isso ou aquilo.

Era comum, na minha infância, ir com o meu pai para a empresa dele, ou “passear” no centro da cidade, enquanto ele ia ao banco, visitar clientes ou qualquer outra tarefa que demandasse andar por aquela região. O maior problema - além de andar bastante, para alguém que tinha pernas tão curtas - era que, a cada quadra, quase em cada esquina, havia uma lanchonete. Uma lanchonete daquelas que emana cheiro de pastel e coxinha, gerando fome automática. No início, eu ficava enchendo o saco do meu pai “pai, compra coxinha! Pai, compra chocomilk! Pai, pai, pai…” e ele dizia que não. Dizia uma, duas, três vezes, aí levantava a voz e eu ficava sem lanche e com bico. Voltávamos pra casa e eu só na vontade. Um belo dia ele me levou novamente para o centro, e eu não pedi nada. Não queria que ele brigasse comigo de volta. Pois no fim do passeio, passamos em uma lanchonete, e ele me comprou uma coxinha e um chocomilk.


Na minha época, ainda era o "Saboroso Choco Milk"

Naquele momento eu aprendi que o ditado “quem não chora, não mama” só serve para bebês, afinal eles só tem essa forma de se manifestar. Eu descobri que era só eu não torrar a paciência do meu pai durante os afazeres dele que no final eu seria recompensado pelo bom comportamento. Obviamente cometi alguns deslizes com o passar dos anos, ao pedir outras coisas que não eram simplesmente uma coxinha e um chocomilk. Mas quando dava errado, eu me lembrava daquele passeio no centro e entendia o porque não ganhei. Com o tempo, também fui descobrindo que, às vezes, eu não ganhava uma coxinha e um chocomilk por falta de condições (dinheiro, tempo, etc.), e não por falta de merecimento. Aí descobri também que não é porque você merece algo que a vida vai te dar. Ao longo dos anos aprendi, com esse pequeno episódio, a ser educado, a ser paciente, o valor do tempo, o valor do dinheiro e que não devemos ser tão pretensiosos a ponto de achar que sempre somos prioridade.


Dinheiro não compra felicidade. Mas compra Coxinha, que é quase a mesma coisa

Não sei se meu pai fez de propósito, se era exatamente essa a lição que ele queria me dar no dia ou se simplesmente bateu a fome e aproveitou pra me levar junto à lanchonete, mas funcionou muito bem. E mesmo que tenha sido apenas um acaso, eu usarei como premissa, pois enquanto muitos ensinamentos são justificados pelos pais como “quando você crescer, irá me agradecer”, esse eu entendi mesmo sendo criança, mesmo sem a maturidade e o conhecimento de um adulto. Isso também me faz pensar em outra coisa: crianças são muito mais espertas do que imaginamos que elas são - talvez bem explicadinho, não será necessário esperar ela crescer pra entender, pois quem sabe um desses acontecimentos não acaba passando batido pela memória? A vontade de comer coxinha passou, ela já não está mais entre nós, mas o aprendizado ficou.

2 comentários:

  1. Extinção de comportamento por ausencia de reforço positivo e intensificação de comportamento com reforço positivo :)

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